Comunidades quilombolas guardam cultura e história de BH

“Manzo, Ventos Fortes de um Kilombo” é o nome do livro que conta a história da comunidade quilombola Manzo Ngunzo Kaiango, localizada na região Leste de Belo Horizonte. A obra, de autoria da própria comunidade junto com a Universidade Federal de Minas Gerais, contou com o apoio da Prefeitura de BH, por meio da Fundação Municipal de Cultura.

Cássia Cristina da Silva, uma das autoras, conta que essa construção literária foi feita em um momento de exaustão em relatar as dificuldades do quilombo. “Nós contamos a história de uma forma ampla, pois cada um tem sua visão sobre o que é ser quilombola. Não queríamos ‘fechar’ a oralidade das pessoas. Não é a história de Manzo, foi uma história que passou por Manzo, por isso o nome do livro é ‘Ventos Fortes de um Kilombo’”.

Para Pedro Henrique Balbino, ilustrador do livro e morador do quilombo, o livro veio como um microfone. “Era o que a comunidade queria falar, mas não tinha espaço e não sabia como. Foi um grito para conseguir reconhecimento e o respeito às nossas tradições”. Agora, segundo ele, é preciso “levar a existência dele para o mundo e mostrar para a sociedade que podemos escrever sobre nós mesmos, sobre tudo o que somos. Não é ser só objeto de pesquisa, mas também ser o pesquisador”.

A comunidade quilombola teve seu valor histórico e cultural reconhecido no fim do ano passado, quando recebeu o título de Patrimônio Cultural Imaterial de BH, junto com outros dois existentes na cidade – Mangueiras e Luizes. A conquista ocorreu depois da aprovação pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de BH de um dossiê com extensa pesquisa documental e de campo sobre as comunidades.

De acordo com Ismael Neiva, da Diretoria de Patrimônio Cultural, Arquivo Público e Conjunto Moderno da Pampulha da Fundação Municipal de Cultura (FMC), a presença da comunidade de Manzo é bastante relevante, principalmente para a região Leste da Capital. “Destaca-se o belíssimo trabalho cultural com jovens e adolescentes, vinculados à capoeira e a música, além do atendimento espiritual, marca singular desse quilombo, pois lá funciona um terreiro de candomblé angola, sob a orientação do preto velho Pai Benedito”.

Segundo Ismael, outro aspecto importante da comunidade é seu trabalho de benzeção, realizado pela matriarca Mametu Muiandê e por seu filho Kemboalá. “Além disso, a comunidade tem acolhido, sistematicamente, no decorrer dos anos, uma gama de pessoas sem lar, que são adotados e inseridos na grande família que é a comunidade de Manzo”.

A comunidade Manzo está localizada no bairro de Santa Efigênia, e seu terreno foi adquirido por sua matriarca, Efigênia Maria da Conceição, de 71 anos, no início dos anos 1970. Atualmente, sua estrutura está sendo reformada e recuperada pela Prefeitura de BH e, de acordo com Ismael, com o registro de Patrimônio aprovado, “ações de salvaguarda, serão pensadas para a manutenção e difusão das atividades e manifestações culturais ocorridas em Manzo”.

Menderson Nzangeby, monitor de musicalização infantil da Escola Municipal George Ricardo Salum, é vizinho e frenquentador da comunidade, e além de reconhecer a importância do quilombo para o seu entorno também contribui com a divulgação positiva do espaço. “Já fiz trabalho com as crianças sobre a comunidade de Arturos, em Contagem, e quando fiz a releitura do congado com as crianças também comentei sobre o Manzo, até mesmo pela proximidade geográfica da escola com a comunidade e pela minha proximidade também”.

Para ele, é fundamental trabalhar esses conteúdos e aproximá-los da educação, pois existem muitas comunidades quilombolas que ainda têm seus direitos negados, e que são marginalizados e vítimas de intolerância e racismo. “A gente aprende é de criança, não é? Creio que seja extremamente necessário mostrar essas histórias, mostrar que o povo negro tem beleza e realeza”, afirma Menderson.

“Esse título de patrimônio cultural de Belo Horizonte é de muita importância para as comunidades quilombolas, pois demonstra o reconhecimento oficial do município, embasado em extensa pesquisa documental e de campo, acerca da relevância dessas comunidades e de suas manifestações culturais na formação da identidade da capital. Alguns dos quilombos estão presentes em seus territórios antes mesmo da fundação de Belo Horizonte e a participação desses sujeitos no cotidiano da capital vem contribuindo para que ela seja cada dia mais uma cidade plural, respeitosa e que busque a inclusão cidadã de todos os seus moradores”, conclui Ismael. 

Fonte: PBH

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