Estudo da Unicamp sugere que covid-19 pode infectar células adiposas
- Rádio AGROCITY
- 14 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 21 de jan.
Foto: Thomas Peter
A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) realizou experimentos que confirmam que o novo coronavírus (Sars-CoV-2) pode ser capaz de infectar células adiposas humanas e de se manter em seu interior. O experimento pode ajudar a entender por que indivíduos obesos correm mais risco de desenvolver a forma grave da covid-19.
Segundo a hipótese investigada na Unicamp, os obesos teriam um maior
reservatório para o vírus em seu organismo. Os obesos também são mais
acometidos por doenças crônicas, como diabetes, dislipidemia e
hipertensão, que também são fatores de risco para serem infectados pelo
novo coronavírus.
Segundo o professor do Instituto de Biologia (IB) e coordenador da
investigação, Marcelo Mori, as células adiposas (que acumulam gordura)
têm capacidade relativamente grande de ser infectadas, se comparadas a
outras células que são alvo primários do novo coronavírus.
“Como é o caso das células do epitélio do pulmão ou do intestino. No
entanto, ainda não se sabe exatamente o porquê dessa carga viral das
células adiposas serem maiores nessas células do que nas outras que
foram usadas para comparação. Isso pode se dar pelo volume dos
adipócitos ser bem maior que as outras células, ou pode ser porque, de
alguma maneira, as células adiposas conseguem internalizar melhor o
vírus. Essas são hipóteses que a gente vem testando. Outra possibilidade
é que exista um mecanismo que favoreça essa internalização do vírus,
que também é algo possível e vem sendo estudado”, disse o professor.
Os seres humanos têm células adiposas em todo o corpo, e os obesos as têm em quantidade e tamanho ainda maiores.
Os experimentos com adipócitos humanos estão sendo conduzidos in vitro,
com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp), no Laboratório de Estudos de Vírus Emergentes (Leve). A
unidade tem nível três de biossegurança, um dos mais altos, e é
administrada pelo professor José Luiz Proença Módena, também do IB, e
coordenador, junto de Mori, da força-tarefa criada pela Unicamp para
enfrentar a pandemia. Os resultados ainda são preliminares e não foram
publicados.
A entrada do vírus na célula de gordura torna-se ainda mais
favorecida quando o processo de envelhecimento celular é acelerado com
uso de radiação ultravioleta. Ao medir a carga viral 24 horas após esse
procedimento, os pesquisadores observaram que as células adiposas
envelhecidas apresentavam carga viral três vezes maior do que as células
“jovens”.
“Quando se induz um processo de envelhecimento precoce chamado de
senescência nessas células, elas triplicam a capacidade de manter o
vírus, de ser infectadas. As células senescentes se acumulam em
indivíduos idosos e em obesos. Uma coisa interessante, que foi
demostrada anteriormente por outros grupos, é que a eliminação das
células senescentes pode, em modelos animais, promover uma longevidade e
proteger contra doenças que geralmente estão associadas ao
envelhecimento, como é o caso do diabetes, e algumas outras disfunções
metabólicas”, explicou o professor.
Diante dessa observação, foram testados fármacos. “Testamos se
fármacos que atuam eliminando essas células poderiam diminuir a carga
viral nas células. Os medicamentos que eliminam células senescentes têm
capacidade bastante significativa de reduzir a carga viral nas células.”
Segundo o professor, isso abre uma possibilidade de utilização desses
medicamentos para eliminação dessas células senescentes para tentar
tratar o SARS-CoV-2. “Nesse sentido, como a gente sabe que idosos e
obesos tem o acúmulo dessas células senescentes e eles estão dentro do
grupo de risco para a doença, pode ser que esse seja o elo entre o maior
risco nessa população e o fato desses indivíduos terem uma maior
severidade da doença. Tudo isso são hipóteses ainda, feito em
experimentos in vitro, ou seja, em cultura de células, precisa ser testado em modelos animais e eventualmente ser testado em seres humanos”.
Para o pesquisador, de concreto para o tratamento da doença hoje,
continua sendo o investimento na qualidade de vida. “A gente só pode
tirar uma lição, se a gente pensar nos grupos de risco, o que a gente
tem que fazer é continuar colocando no nosso estilo de vida práticas
para promover a saúde, principalmente a saúde metabólica para viver
melhor: com uma nutrição adequada, exercícios regulares, mesmo que
isolamento fazer atividade física dentro de casa”, aconselha.
Etapas seguintes
As etapas seguintes da pesquisa incluem a análise de adipócitos
obtidos diretamente de pacientes com diagnóstico confirmado de covid-19,
obtidos por meio de biópsia.
Também serão conduzidas análises de proteômica (análise global e em
larga escala dos proteomas, que são o conjunto de proteínas e suas
isoformas expressas em uma amostra biológica, ou seja, em um organismo,
tecido, biofluido ou célula) para descobrir se a infecção pelo
Sars-CoV-2 afeta o funcionamento do adipócito e se deixa alguma sequela
de longo prazo na célula.
Essa etapa da pesquisa será feita em colaboração com o professor do IB-Unicamp Daniel Martins de Souza.
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