O Novo Marco do Audiovisual: Regulamentação do Streaming e a Cobrança da Condecine Aprovada na Câmara
- Rádio AGROCITY

- há 3 dias
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Introdução
Em uma votação de grande repercussão para a economia criativa e para o mercado de comunicação no país, a Câmara dos Deputados aprovou, na noite de terça-feira (4/11/2025), o texto-base do Projeto de Lei (PL) nº 8.889/2017. O projeto, que estabelece o Marco Regulatório do Streaming no Brasil, impõe obrigações de investimento em conteúdo nacional e institui a cobrança gradual da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) sobre as receitas brutas das plataformas de Vídeo sob Demanda (VoD), como Netflix, Amazon Prime Video e Disney+.
O avanço deste PL no Legislativo Federal representa a mais significativa intervenção regulatória sobre o setor de entretenimento digital no Brasil. A proposta, que tramita há quase uma década, busca reequilibrar o mercado audiovisual, garantindo que o crescimento exponencial das plataformas globais de streaming resulte em fomento direto e regionalizado à produção de conteúdo brasileiro. O debate político em torno da medida é complexo, envolvendo desde a defesa da soberania cultural até a preocupação com o possível impacto econômico sobre o consumidor final e a atuação da Agência Nacional do Cinema (Ancine) como órgão regulador.
O Detalhe da Proposta/Decisão
O texto-base aprovado, relatado pelo Deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), é um aprimoramento de propostas anteriores e articula dois pilares centrais: a tributação e as cotas de tela.
A Cobrança da Condecine-Streaming: O projeto estabelece uma alíquota progressiva e escalonada da Condecine sobre a receita bruta anual das empresas de VoD (Serviço de Vídeo sob Demanda) e de TV por aplicativos. A alíquota máxima é fixada em 4% para as plataformas de maior faturamento (acima de R$ 350 milhões anuais). O texto introduz um mecanismo de incentivo crucial: a alíquota pode ser reduzida em até 75% caso a plataforma invista mais de 50% do total de seu conteúdo audiovisual em obras brasileiras. Essa redução visa estimular o investimento voluntário das empresas.
Cotas de Conteúdo Nacional e Regionalização: O PL define que as plataformas devem ter uma cota mínima de 10% de conteúdo audiovisual brasileiro em seus catálogos. Desse percentual, metade deve ser dedicada a obras brasileiras independentes. O projeto ainda garante a destinação regionalizada dos recursos arrecadados:
30% para produtoras brasileiras independentes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
20% para produtoras independentes da região Sul e dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo.
10% para produtoras independentes de São Paulo e Rio de Janeiro (exceto capitais).
O prazo de transição para o cumprimento das cotas foi fixado em seis anos, permitindo que as empresas se adaptem gradualmente às novas exigências. A fiscalização e regulação da atividade serão de responsabilidade da Ancine, que precisará credenciar previamente as provedoras de serviço.
Impacto no Setor Produtivo (Agronegócio e Economia)
Embora a regulação do streaming pareça, à primeira vista, distante do universo do Agronegócio e da economia tradicional, seu impacto se manifesta em, pelo menos, três frentes econômicas e culturais que afetam o panorama nacional:
Fomento à Economia Criativa: A injeção dos recursos da Condecine (que passará a ser chamada Condecine-Streaming) no setor audiovisual deve gerar um ciclo virtuoso de empregos e renda. Para estados com forte vocação cultural, como Minas Gerais, a garantia de que 20% dos recursos regionalizados serão destinados a projetos do Sul, Minas e Espírito Santo representa um impulso significativo. Isso pode se traduzir em novas produtoras, maior demanda por profissionais técnicos e artísticos, e, indiretamente, o desenvolvimento de indústrias correlatas (como turismo de locação, serviços de hotelaria e alimentação para equipes de filmagem).
Diversificação Narrativa e Imagem do País: A imposição de cotas e o fomento regionalizado tendem a diversificar os temas abordados pelo audiovisual. Atualmente, o Agronegócio brasileiro, que é o motor da economia nacional, raramente é representado com a profundidade institucional e econômica que merece. Com mais recursos e a obrigação de regionalização, há uma janela de oportunidade para o surgimento de documentários, séries e filmes que retratem a inovação tecnológica no campo, a sustentabilidade na produção e a complexa cadeia produtiva que sustenta o país, ajudando a moldar a percepção pública e internacional do setor.
Risco para o Consumidor e Custo Regulatório: O principal risco econômico, levantado pelas plataformas, é o repasse do custo da nova contribuição para o consumidor final, o que poderia se manifestar em aumento das mensalidades. Além disso, o custo de compliance e a burocracia para a adequação às cotas podem dificultar a atuação das empresas no país. Para a economia como um todo, o aumento da tributação, mesmo que setorial, precisa ser observado de perto para evitar um impacto inflacionário em um serviço de consumo em massa.
O Debate Político e as Divergências
A votação do PL do streaming dividiu o Congresso, refletindo uma disputa clássica entre os Três Poderes: a defesa da intervenção estatal para o fomento cultural versus a liberdade de mercado e o papel da tributação.
A Favor da Regulação (Governo e Setor Audiovisual Nacional): O Ministério da Cultura (MinC) e a maioria da base governista, além das produtoras nacionais independentes, defendem a aprovação como um ato de soberania nacional e cultural. O argumento central é que as plataformas de streaming operam no Brasil e geram lucros significativos, mas historicamente não contribuem para o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), como fazem as TVs por assinatura e emissoras abertas. Para os defensores, o projeto corrige essa distorção, garantindo que "o dinheiro que sai do Brasil volte em forma de conteúdo feito por brasileiros". A cota de tela é vista como essencial para que as produções nacionais não sejam sufocadas pelo volume de conteúdo estrangeiro.
Contra a Regulação (Plataformas e Parte da Oposição): As gigantes globais de streaming e setores da oposição criticaram a obrigatoriedade das cotas e a nova contribuição. O principal argumento é que a medida representa uma "taxação da internet", que onera as empresas e, consequentemente, o consumidor. As plataformas alegam que já investem bilhões em produção local por interesse comercial e que a intervenção regulatória excessiva, especialmente a rigidez da Condecine e das cotas, pode desestimular o investimento e a diversidade de catálogo, ou até mesmo levar à restrição de conteúdo. O debate se concentrou em destaques que buscavam excluir o YouTube (serviço de compartilhamento) da tributação, o que foi rejeitado pelo Plenário.
Cenários Futuros e Próximos Passos
Com a aprovação do texto-base na Câmara, o projeto segue para a votação dos destaques — emendas que buscam modificar trechos específicos do texto. Esta fase é crucial e pode gerar novas tensões, principalmente em relação ao percentual final da Condecine e às regras de exclusão de determinados serviços (como plataformas jornalísticas ou educacionais) da obrigatoriedade.
Após a conclusão da votação na Câmara, o PL 8.889/2017 será enviado para o Senado Federal, onde passará por nova análise e votação. O debate no Senado deve ser igualmente intenso, com a possibilidade de o texto ser alterado novamente, o que o faria retornar à Câmara para nova deliberação (bicameralismo). Somente após a aprovação final nas duas Casas do Congresso Nacional o projeto poderá ser enviado para a sanção presidencial. A expectativa é que o Palácio do Planalto, alinhado com o MinC, sancione a maior parte da proposta, estabelecendo o novo marco legal ainda no primeiro semestre do próximo ano. A efetiva entrada em vigor da lei dependerá da regulamentação detalhada, a ser feita pela Ancine.
Conclusão (Chamada de Ação - CTA)
A aprovação do Marco Regulatório do Streaming é um exemplo didático da complexidade do processo legislativo e da interconexão entre política, cultura e economia digital. Leis como essa moldam o ambiente de negócios e a identidade cultural do país, tendo consequências diretas sobre o desenvolvimento regional e a geração de emprego, inclusive em setores auxiliares à grande economia do Agronegócio e da indústria. A transparência na aplicação dos recursos da Condecine e a eficácia da Ancine na fiscalização serão determinantes para que o projeto atinja seus objetivos.
Acompanhar a tramitação no Senado e a subsequente regulamentação pelo Executivo é um dever cívico. A fiscalização cidadã e a análise institucional são a melhor ferramenta para garantir que as leis cumpram seu propósito original. Mantenha-se informado sobre os próximos passos deste e de outros projetos vitais para Minas Gerais e para o Brasil. Sintonize a Rádio AGROCITY (Rádio Agrocity) para acompanhar a cobertura aprofundada dos Três Poderes, análises de nossos analistas e entrevistas exclusivas com parlamentares e especialistas do mercado.







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